Cabeçudas: a polêmica do nome e criação do balneário
A área de Cabeçudas abrange boa parte do litoral itajaiense, iniciando na confluência da Estrada Geral – Rua Deputado Francisco Evaristo Canziani – com a Rua Santa Isabel – na curva da sede da AABB – terminando no cume do Morro do Farol. Cabeçudas é considerada por muitos historiadores do setor de turismo como o primeiro balneário do Estado de Santa Catarina. Os imigrantes alemães teriam trazido esse novo conceito, para uso das praias, da Europa ao promoverem suas viagens de lazer e negócios no Velho Continente.
O nome Cabeçudas oferece pelo menos cinco interpretações dadas por populares: 1 – A primeira faz referência às tartarugas que, nos primórdios da colonização, ainda frequentavam a praia para desovar. Essas tartarugas chamavam atenção por terem cabeças grandes e eram popularmente chamadas de ‘as cabeçudas’; 2 – A segunda possibilidade da interpretação do nome faz referência às formigas encontradas em grande número no local que também eram denominadas de cabeçudas; 3 – A terceira, faz referência aos nativos do nosso litoral que tinham cabeça grande. Quando da ampliação da sede do Iate Clube, 1971, ainda foram encontrados restos mortais desses silvícolas, hoje sob guarda do Museu do Homem do Sambaqui – Colégio Catarinense – Florianópolis; 4 – A quarta, faz referência à morraria existente na região que formava ‘cabeços’ adentrando o mar: Morro do Farol, Morro da Caverna do Morcêgo, Morro do Atalaia. Esses ‘cabeços’ serviam de referência para os navegantes localizarem a foz do Rio Itajaí no tempo anterior à 1902, ano da construção do Farol de Cabeçudas.
Por muito tempo a expressão Cabeçudas foi utilizada nos dois gêneros e, também, no plural e singular: Cabeçudo/Cabeçuda, Cabeçudos/Cabeçudas. O termo no masculino e singular (cabeçudo) fazia referência expressa ao Morro do Farol. Quando no plural, o termo fazia referência principalmente ao Morro do Farol e Morro do Atalaia, podendo também incluir o Morro do Morcêgo. O criador da Colônia Belga em Ilhota – Van Lede, em 1843, cita em seu relatório de viagem a ‘Ponta da Cabeçuda’. Já o colonizador Hermann Blumenau cita, em relatório de 1853, o ‘Morro das Cabeçudas’. O Jornal do Instituto Histórico e Geographico Brazileiro, de abril de 1845, cita a ‘ponta … Cabeçudo’ e ‘Ponta da Cabeçuda e da Cabeçuda Grande’. O livro ‘Praticagem e roteiro da Costa Sul do Brazil – do Rio de Janeiro a Montevídeo’, datado de 1901, fala da ‘ponta da Cabeçuda’ e ‘cabeçuda’.
Na publicação de 1816, “Memória política sobre a capitania de Santa Catharina” escrita por Paulo Joze Miguel de Brito, há menção a esta ponta cabeçuda: ‘O porto de Tajahi he pequeno e pouco frequentado por não haver ali povoação, mas he seguro e abrigado, e pode vir a ser de transcendente utilidade como ao diante direi: a sua entrada he entre o pontal do norte e a ponta cabeçuda do lado do sul, com 6 a 7 braças de fundo (…)’. O jornal ‘O Conservador’, de 24 de maio de 1899, também utilizou o termo ‘Cabeçuda’. Assim, se poderia afirmar que incialmente o nome daquela localidade foi associado à ponta de um morro especificamente, o atual Morro do Farol. Contudo, em 1862 uma nota do jornal ‘O Mercantil’, edição de1862, chamou a enseada de ‘Cabeçudas’, no plural. Mapa das colônias alemãs em Santa Catarina, datado de 1867, sinaliza a localização da enseada com o nome ‘Cabeçudos’. Marcos Konder, em ensaio datado de 1927, afirma que a denominação Cabeçudas se deu ‘… por causa do cabeço do morro, onde se erige um pharol (…)’.
A criação do Balneário
No início Cabeçudas era apenas um ponto de pesca e moradia para poucas famílias de pescadores artesanais. Com o desenvolvimento da colonização no Vale do Itajaí os navios que transportavam os imigrantes europeus, por conta das dificuldades apresentadas pela barra em tempos de mar revolto, fundeavam na enseada e desembarcavam passageiros e mercadorias na Prainha – local onde posteriormente foi construída a rampa do Iate Clube Cabeçudas. O Porto de Itajaí, chegou a ser projetado para o local e a estação final do trem – na Esplanada, Fazenda – já previa a possibilidade do ramal ferroviário continuar o trajeto até a ponta sul de Cabeçudas. Assim, o Porto de Itajaí iria ficar muito parecido com o formato do Porto de São Francisco do Sul, tomando toda a enseada de Cabeçudas.
Mas o projeto do porto ganhou novos contornos com as obras dos molhes da barra e a construção do porto público no Rio Itajaí a partir do mandato do ministro Lauro Müller. A região acabou completamente ocupada por casas de veraneio, principalmente construídas por imigrantes alemães. Eles começaram a chegar aos poucos, inovando ao utilizar a praia como área de lazer, práticas esportivas e terapêuticas – um modelo copiado da Europa. O superintendente Marcos Konder foi o grande entusiasta desse modelo, transformado Cabeçudas no Balneário Cabeçudas. É dele a ideia de plantar as árvores frondosas, existentes até os dias de hoje, ao longo da orla. No ano de 1926 ele assina a Lei nº 136 que estabelece desapropriações de terras para retificar da Estrada Geral de acesso à Cabeçudas, além do arruamento e iluminação pública da Rua da Praia – atual Rua Juvência Tavares d’Amaral. No dia 16 de julho de 1927, Marcos participa da reunião do Conselho Municipal (atual Câmara de Vereadores) oportunidade em que requereu autorização para consolidar um plano de edificação, arborização e saneamento do Balneário de Cabeçudas.
Algumas referências históricas
– O Farol de Cabeçudas foi inaugurado no ano de 1902.
– O caminho pelo litoral começou a ser aberto com as obras do molhe da barra, nas primeiras décadas de 1900, que necessitou dinamitar diversas partes das encostas dos morros para fornecer pedra ao empreendimento.
– A imagem do nosso litoral foi totalmente modificada em 1917 quando a campanha no combate à malária obrigou os proprietários de terras a colocar fogo em boa parte da mata ali existente.
– A igreja em adoração a Santa Teresinha foi criada na década de 1920, sendo incluída, em 1968, na jurisdição da Paróquia Nossa Senhora de Lourdes – da Fazenda.
– No ano de 1912 surge o Hotel Herbst.
– No ano de 1921 foi aberto o restaurante de propriedade de Eduardo Neitzel e a Empreza de Transporte Zimmermann & Cunha passou a operar com ‘auto-ônibus’ no transporte de passageiros na linha Centro-Cabeçudas. A mesma linha passa a ser operada, em 1934, pela Empreza Auto-Viação Itajahy Ltda.
– No ano de 1926 é aberto o Restaurante Mira-Mar de Manoel José dos Santos.
– Em 1927 surge o Restaurante Zwölfer, de José Zwölfer, empreendedor que criou em 1928 o Hotel Cabeçudas. Também merece destaque a iniciativa do comerciante Elói Cordeiro que manteve casa comercial e o Hotel Cordeiro – que depois deu lugar ao Marambaia Cabeçudas Hotel.
– A localidade ganha energia elétrica no ano de 1928 quando era governador do Estado de Santa Catarina Adolpho Konder. Ainda, no ano de 1928, Marcos propõe ao Conselho Municipal utilizar uma antiga trilha indígena para abrir uma ‘variante’ pelo Morro Cortado.
– Com a ascensão de Irineu Bornhausen ao governo de Santa Catarina [1951-1956] e o domínio do sistema financeiro-industrial estadual pelo conglomerado liderado pelo Banco Inco – Banco Indústria e Comércio – Cabeçudas passou a ser conhecida como a ‘República de Cabeçudas’, o centro do poder do Estado de Santa Catarina.
– Ainda nesse contexto, foi criado no ano de 1958 o Iate Clube Cabeçudas, local de reunião de banqueiros, industriais e políticos.
– O prefeito Jandir Bellini sancionou a Lei n° 3359, de 21 de dezembro de 1998, dividindo o perímetro urbano de Itajaí em Zonas Administrativas. Cabeçudas ficou como Terceira Zona, compreendendo o seguinte território: ‘Rio Itajaí-Açu no Oceano Atlântico, por este até a ponta do Farol, segue pela Rua Samuel Heusi Júnior até seu ponto mais alto, deste ponto pelo divisor de águas de Cabeçudas com a Praia Brava, até encontrar o limite com a Fazenda, por este até o ponto inicial’.
TEXTO: Magru Floriano – elaborado para publicação na revista digital Sopa de Siri – edição de agosto de 2025.